Resumo:
Esta tese objetiva compreender de que forma se dá o exercício da sexualidade e a construção e
a afirmação das identidades de gênero, sexuais e étnico-raciais entre mulheres negras que se
relacionam afetivamente e sexualmente com mulheres na prisão, a partir de pesquisa realizada
no Conjunto Penal de Feira de Santana, unidade prisional do estado da Bahia. O Estudo, que
utiliza a perspectiva interseccional, tem a proposta de evidenciar se, nas relações estabelecidas
na prisão, estão manifestas, entre as mulheres em situação de encarceramento, a resistência
e/ou a submissão à discriminações como racismo, sexismo e lesbofobia. Analisa de que forma
a prisão, instituição punitiva racializada, estrutura-se historicamente enquanto mecanismo
disciplinar e como operacionaliza, através de suas práticas normativas, gênero, raça e
sexualidade. Aborda também o surgimento das prisões femininas e demonstra a forma como
as construções sobre gênero, raça e sexualidade constituem a cultura prisional, subsidiando
processos de normalização e controle das mulheres em situação de encarceramento. O estudo
ainda realiza uma discussão conceitual e histórica da categoria "gênero" através de diferentes
teóricas feministas, faz uma incursão na construção da lesbianidade, a partir de vertentes
do pensamento lésbico contemporâneo; ainda como percurso teórico, aborda a teoria
feminista negra e se apropria da perspectiva interseccional. Do ponto de vista metodológico,
utiliza a etnopesquisa implicada de forma a articular implicações histórico-existenciais e
estruturo-profissionais, que trazem para esta pesquisa uma perspectiva distinta, com sentidos
entrelaçados e atravessada pelas identidades e posicionamentos da pesquisadora. Utiliza,
como instrumentos metodológicos de investigação, entrevistas narrativas, observação
participante, oficinas temáticas e produção áudio-visual de vídeo, Apresenta breve perfil das
mulheres negras em situação de encarceramento que se relacionam afetiva e sexualmente com
mulheres, e demonstra que, a despeito de as práticas e discursos da prisão reiterarem a
heteronorma, esta é transgredida e desestabilizada por muitas mulheres no cárcere, através da
transposição dos limites de gênero e sexualidade a partir da reinvenção do próprio corpo e da
sexualidade ao vivenciarem novas expressões da sexualidade com as relações afetivas e
sexuais entre mulheres ou relações lésbicas. O estudo conclui que as identidades de gênero
são desestabilizadas pelas mulheres na prisão através de uma explosão de categorias que elas
performatizam, rasurando as construções binárias de gênero e inventando novas
masculinidades femininas. Estas novas (re)construções de gêneros e sexualidades resultam na
produção de diversos arranjos identitários que resistem à normatividade, como a "lady", o
"viado", a "lailou", o "cabra safado", a "mulher meio homem", a "lésbica" e a "entendida". A
pesquisa confirma que a identidade lésbica ou a relação afetiva e sexual de mulheres em
situação de encarceramentos é algo fluído, temporal e processual, construído a partir do
encarceramento e apesar dele, sendo possibilidade de libertação da heterossexualidade
compulsória, mesmo que efemeramente, e propiciada pelo afastamento da família e demais
instituições às quais pertenciam, vigilantes do cumprimento das normas de gênero e
sexualidade. Por fim, confirma a sororidade ou o "continuum lésbico", construído entre as
mulheres na prisão, como rota de fuga e deslocamento da heteronorma.
Ano da publicação: 2019
Publicado por/em: Pós-Cultura - Tese - Universidade Federal da Bahia
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